terça-feira, abril 07, 2009

"Itália fez calar cientista que previu o terramoto há várias semanas"

"Um cientista italiano previu um grande terramoto na área de L'Aquila algumas semanas antes da catástrofe que hoje afectou esta cidade do centro de Itália, mas foi denunciado às autoridades por espalhar pânico. O balanço mais recente ia em mais de cem mortos, 1500 feridos e 50 mil desalojados.

O Governo insistiu hoje em que o aviso, lançado pelo sismólogo Gioacchino Giuliani, não tinha fundamento científico, mas disse que tinha sido vingado e pediu que lhe fizessem um pedido de desculpas.

Os primeiros tremores na região foram sentidos em meados de Janeiro e continuaram, com intervalos regulares, criando um receio crescente nesta cidade medieval, cerca de cem km a leste de Roma.

Há um mês, carrinhas com altifalantes percorreram a cidade, com cerca de 50 mil habitantes, dizendo à população que evacuasse as suas casas, após Gioacchino Giuliani, do Instituto Nacional de Astrofísica, ter previsto que estava para acontecer um terramoto de grande magnitude, o que desencadeou a fúria do presidente da câmara local.

Giuliani, que baseou a sua previsão nas concentrações de gás radão em torno de áreas com actividade sísmica, foi denunciado à polícia por “espalhar alarme” e foi obrigado a retirar as suas conclusões da internet.

“Não sabia para quem me virar”

“Agora há pessoas que têm de me pedir desculpa e que vão ficar com o que aconteceu na sua consciência”, disse Giuliani ao “site” do diário “La Repubblica”.

O cientista, que vive em L'Aquila e que chegou àquela conclusão enquanto trabalhava no Instituto Nacional de Física Nuclear na região de Abruzzo, disse que ficou impotente para actuar no domingo, quando se tornou claro que o terramoto estava iminente. “Não sabia para quem me voltar, tinha sido posto sob investigação por dizer que ia haver um terramoto.”

Quando, em conferência de imprensa, a comunicação social lhe perguntou se, perante estes avisos, o Governo tinha protegido adequadamente a população, o primeiro-ministro, Silvio Berlusconi, pareceu ter uma atitude defensiva.

Berlusconi disse que para já as pessoas se deviam concentrar nos esforços de socorro e que “depois poderemos discutir a previsibilidade dos terramotos”." (in Público)

*para além da história que vai ficar na História, pergunto-me se não será este mais um génio incompreendido pela ciência do momento.
por outro lado, é incrível como a censura impera em Itália - obrigar alguém a retirar da internet uma opinião científica sobre determinado assunto...ainda falam de Portugal.

4 comentários:

edu disse...

Meu bom sábio Jorge.

Apesar da concentração de gás radón, quando superior aos níveis normais, indiciar um aumento da actividade sísmica, a previsibilidade de um fenómeno natural extremo como um sismo é ainda bastante limitada. E repara que a monitorização da concentração deste gás no estudo dos sismos já é utilizada há muito, sobretudo na região da falha de Sto. André, ao largo da Califórnia, uma área bastante activa do ponto de vista dos abalos telúricos.

De facto, o geólogo em questão previu a probabilidade de existência de um sismo de grande magnitude, na região. No entanto, as suas previsões apontavam para um epicentro localizado a cerca de 30 Km de L'Áquila e isto foi há pouco mais de um mês atrás. Isto é que a Comunicação Social devia ter dito e não disse.

Depois, imagina que Giulliani era levado a sério e que as pessoas dessa cidade para onde o cientista previu o epicentro, fugiam, por exemplo, para L'Aquila?

Infelizmente, tenho que concordar com a comunidade cientifica internacional uma vez que, no que a previsão de catástrofes naturais diz respeito há três principios básicos a ter em conta e que não foram de todo atingidos pelas intenções de giulliani:

1 - Definir exactamente o local do fenómeno. Como referi giulliani não só se enganou no local da sua previsão.

2 - Definir a localização. Ora o nosso cientista não conseguiu determinar com firmeza se o sismo seria um dia, uma semana, um mês ou um ano depois das suas conclusões. (Imagina uma ciadade inteira a parar por tempo indeterminado, à espera de um sismo que não se sabe quando terá lugar).

3 - Determinar o potencial destrutivo do fenómeno. Giulliani apenas referiu o facto de se poder tratar de um sismo de grande intensidade, mas não conseguiu ser conclusivo ao nível da magnitude do mesmo no sentido de se proceder ao zonamento de áreas de maior risco, em função da vulnerabilidade de bens materiais e vidas humanas.

Espero ter apimentado a tua dissertação com este (pequeno) contraditório.

Já agora... http:\\terraruim.wordpress.com

Jorge Oppenheim disse...

;) ainda assim é estranho o facto de o tipo não ter sido sequer ouvido por ninguém. e melhor ou pior, o bitaite andou lá perto.

quanto à questão de ter sido obrigado a retirar as suas conclusões ("melhor ou pior" científicas) da internet, continuo a ter certeza da restrição inconstitucional e inaceitável da liberdade de expressão.

edu disse...

Existe um código deontológico entre os investigadores das catástrofes naturais que assenta no facto de que por vezes os alarmismos devem ser evitados ao máximo sob pena de se disseminar o caos e a desorganização total, cujos impactos podem muito bem vir a ser ainda piores do que os da consumação da catástrofe.

Por outro lado, os alertas devem ser dados pelas autoridades de proecção civil e ter um plano de gestão de crise e mitigação de danos. Não sei se giuliani tinha publicado alguma coisa do género.

Tendo em conta o grau de incerteza associado fiabilidade das previsões do fenómeno em causa, pode muito bem ter sido essa a razão que levou a que o geólogo tenha sido obrigado a remover as suas considerações.

Quanto à inconstitucionalidade do acto de forçar a remoção dos conteúdos, só tenho mesmo que concordar contigo, porque disso percebes tu e a montes! No máximo, as tais autoridades de protecção civil, elaboravam um desmentido, baseado também em considerandos técnicos e cientificos que rebatessem as previsões de giuliani.

Jorge Oppenheim disse...

Exacto!!!

no fundo, para saber se uma restrição a um direito fundamental é constitucional ou não há que ponderar os vários bens em jogo. autocitando-me, a panaceia dos direitos fundamentais reside hoje na ponderação de bens.

ou seja, de um lado temos os bens liberdade de expressão, desenvolvimento da personalidade, etc. e do outro possíveis danos noutros direitos fundamentais de terceiros provocados, neste caso, pela possibilidade de "caos e desorganização total" como disseste.
há que pesar tudo. ainda assim, em sede de proibição do excesso (de actuação da Administração) devemos sempre procurar meios menos restritivos, e, como identificaste muito bem, haveriam outros meios muito menos restritivos, que, tudo ponderado, não ofendiam a Constituição.
:)